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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Duplo luto

Marina Silva escreve


A terrível tragédia em Santa Maria (RS) lança o país no luto. A negligência pode provocar horrores. De repente, tantos jovens universitários perdem suas vidas e centenas de famílias enfrentam o pior pesadelo. O Brasil chora e sabe que a juventude, a energia e a graça dessas pessoas farão falta na construção do futuro.
O luto de Santa Maria nos comove e faz questionar a ação do poder público para garantir a segurança nos lugares onde os jovens se divertem. É hora de responsabilizar a todos que, por força de seus cargos, devem prestar contas de seus atos e omissões.
O Brasil não tem sido uma ªmãe gentilº para seus jovens. Se a fiscalização de uma casa noturna frequentada por milhares de estudantes é negligenciada, o que mais será? Talvez as escolas. Talvez os hospitais. Talvez tudo o mais.
O que dizer da tragédia cotidiana que atinge nossa juventude? O Mapa da Violência, levantamento feito anualmente sob a coordenação do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, com apoio do Instituto Sangari e do Ministério da Justiça, coloca o Brasil como um dos países mais violentos do mundo.
Nas duas últimas edições, o mapa focou as vítimas mais frequentes de morte violenta: jovens e negros. Se os números mostram um quadro triste, ao olhar para jovens e negros vê-se um cenário pior do que o de uma guerra.
Os dados de 2008 mostram que o Brasil tinha a incrível taxa de 26,4 homicídios a cada 100 mil habitantes e que, entre os jovens, esse número saltava para 52,9. O Estado campeão em violência contra os jovens era Alagoas (taxa de 125,3), seguido de Espírito Santo (120) e Pernambuco (106,1). A tragédia nos municípios campeões em violência são ainda mais impressionantes: Maceió (AL), com taxa de 251,4 homicídios de jovens a cada 100 mil habitantes; Serra (ES), com 245,8. Itabuna (BA), com 229,4. É uma carnificina.
Em 2010, a situação não havia melhorado. E o Mapa da Violência mostra que as taxas de homicídio no Brasil, inaceitáveis para todas as etnias, são inacreditáveis entre jovens e negros. São 28,3 jovens brancos mortos a cada 100 mil habitantes. Entre os jovens negros a taxa é de 72. A cidade campeã em homicídio de jovens negros é Simões Filho (BA), com 455,8 mortes por 100 mil habitantes, seguida de Ananindeua (PA), com 389,5. Lauro de Freitas (BA) tem 365 e Maceió (AL) tem 328,8.
A educação poderia salvar muitos jovens, modificar seu ambiente e realizar suas vocações. Mas o IBGE mostra que quase a metade (49,25%) dos brasileiros com mais de 25 anos não terminou o ensino fundamental e que 19,5% das pessoas com idade entre 18 e 25 anos, mais de 5,3 milhões de brasileiros, não estuda nem trabalha.
Assim, o futuro fica comprometido. Choremos por Santa Maria. Choremos pelo Brasil.

Da Folha de São Paulo de 01/02/2013